O inconsciente e o gozo
O Gozo na leitura de J. –D. Nasio
Introdução.
Qual seria o intuito de fazer um resumo de um resumo?
Em primeiro lugar, acredito que o conhecimento pode ser adquirido por fontes secundárias e não acredito que resumir seja um processo acrítico, onde se aceita o que tal autor diz de tal outro autor. Pode chegar o momento de ler um autor e comparar uma leitura pessoal com a leitura de seus intérpretes. Mas isso não é, em minha opinião uma necessidade. Aliás ler um livro ou um autor é mais um encontro do que uma necessidade.
Em segundo lugar, acredito que fazer a síntese dos pensamentos de Nasio sobre Lacan e alinhá-los aos meus próprios é um exercício conceitual válido. Meu objeto é a visão de Nasio sobre um conceito central da teoria lacaniana (e não a teoria lacaniana em si). O conceito em questão é o de gozo.
Por fim, essa síntese crítica vem também do encontro com esse conceito, tal como descrito por Nasio, que me parece útil para a minha clínica. Sendo assim, pouco importa (agora) se Nasio é ou não fiel a Lacan, etc., etc.
Goostaria, aqui, de organizar as minhas idéias e as compartilhar.
O inconsciente e o gozo.
Inconsciente e gozo são conceitos que diferem por sua natureza em relação à obra de Freud. E aqui, remeto a questão a Freud pois um (o inconsciente) é um conceito fundador no pensamento Freudiano e o outro (o gozo) é um conceito desenvolvido por Lacan a partir de uma leitura muito particular da obra de Freud.
Pos bem, na obra de Lacan, a cada um desses conceitos (inconsciente e gozo) estão conectados um axioma: “O inconsciente é estruturado como uma linguagem” e “Não existe relação sexual”. A promessa de Nasio, nesse estudo, é a de que, ao submeter essas proposições à clínica, haveria uma mudança essencial da escuta e da própria ética do analista. Vejamos o porquê.
O Inconsciente.
O analista tem inicialmente acesso a que? Ao sintoma, a um evento na análise, a uma imagem, um signo através da qual se dá uma experiência analítica e toda experiência é um momento privilegiado, perceptível, pontual e fugaz. É o momento em que o paciente faz e diz e não percebe o que fez ou disse. É o momento em que, confrontado ao seu ato e sua fala, desconhece as razões que o fizeram atuar e dizer. É o momento em que ele hesita, em que a linguagem tropeça.
Lembremos que, para Freud, o sintoma é um compromisso entre desejo recalcado inconsciente e sua realização. O problema é que o sintoma não satisfaz o desejo, ele perpetua a falta e essa falta somente se faz presente na falha, quando a palavra escapa, quando o ato surpreende ou seja, quando o que está recalcado emerge como um não-evento ou um não-sentido.
O sintoma causa sofrimento por essa aura de non-sense que reveste a fala do paciente. Aqui um pequeno parênteses meu sobre essa questão: há, em todos nós analistas, uma tentação muito presente em interpretar a fala do paciente. Dar sentido a ela, ou conduzi-lo no processo que dará sentido a ela. Há um desejo nosso. Recentemente, ouvi de uma colega o relato sobre um caso onde sua paciente dizia que não sabia se responderia a um contato de um ex-namorado que a havia abandonado por e-mail, após eles terem alugado um apartamento em que iriam morar juntos. A paciente não sabia o que fazer. Levada a questão ao seu supervisor, disse ele à minha colega, você poderia ter sido mais assertiva e perguntado “o que esse sujeito quer com você?” Uma pergunta carregada de um tom paterno, de censura, de corte. Acredito que esse tipo de intervenção pode ter uma função, mas há que se considerar a falha, o não saber da paciente como sintoma, esse evento privilegiado em que, para ela, tudo escapa e foge ao controle; em que, portanto, introduzir uma interpretação pode retirar a possibilidade de elaboração.
Voltando a Nasio, o sintoma também são as teorias que o analisando irá formular para compreender o seu mal-estar. Por que surge, por exemplo, a dúvida nessa paciente? Ao psicanalista cabe favorecer a elaboração, cuja possibilidade se abre pela surpresa e pelo desconforto ou desconserto. Nesse processo, o analista vai se tornar o destinatário do sintoma. Aqui, então, talvez, uma interpretação possa emergir.
O grande desafio de um analista é, primeiro tornar-se o destinatário, para, depois, tornar-se a causa do sintoma do paciente e, então, ter estofo para sustentar essa posição e se tornar o sujeito-suposto-saber. O sujeito-suposto-sabe não é somente detentor de um conhecimento sobre o paciente, mas, principalmente, ele está na origem de seu sofrimento ou de qualquer acontecimento inesperado, sem sentido. Aqui, devo, mais uma vez, colocar um parênteses meu: o sujeito-suposto-saber é parte do problema porque ele é parte da solução. Como nos ensina Murray Edelman, politólogo construcionista, as soluções precedem os problemas. Ou melhor, os problemas são o sub-produto das soluções que legitimam a posição de um agente, no caso, o sujeito-suposto-saber. Sendo assim, o analista só está legitimado em sua posição se for a origem do problema para o qual supostamente detém a solução. Ainda nesse meu rápido parênteses gostaria de especificar que essa não é a única forma de encarar a relação analítica. Acredito que há um caminho mais perigoso (para o analista) que é o de adoecer com o paciente, que é deixar o paciente falar não ao sujeito-suposto-saber, mas à parte doente em nós analistas, criada pelas projeções do analisando e que fazem eco em nosso inconsciente, em nosso ser neurótico, histérico ou psicótico. Mas, voltemos, mais uma vez a Nasio.
Um outro aspecto importante do sintoma é o de conter uma face de signo e uma face de significante. Signo é aquilo que representa algo para alguém, é o que o analista se torna, por exemplo: o Outro do sintoma e, depois, a causa do sintoma. É um representamen, ou seja, algo que, para alguém, faz as vezes de alguma coisa, em alguma relação a a algum título. Cria, portanto, na mente do destinatário um signo equivalente ou, pelo menos, derivado. O signo favorece, assim, a instalação da transferência.
Já o significante é uma categoria formal, é desprovido de sentido, é involuntário, é perceptível mas ligado a um conjunto de significantes imperceptíveis (um significante somente o é para outros significantes). O sintoma tem, assim, a face de um significante, como o lapso, o ato, o gesto, o silêncio ou a interpretação. A principal característica de um significante é que ele se repete, apesar das tentativas de dominá-lo. O significante, assim conceituado, se distingue da realidade concreta de um sintoma, de sua expressão (ex.: fobia de pontes). Pode-se significar esse significante, mas ele só é significante porque retorna com a força de um acontecimento involuntário, desprovido de sentido e pronto para se repetir (S1). Por isso, o sintoma, significante, está no que nos escapa, na falha.
O sintoma, significante, faz o paciente sofrer, mas o informa sobre algo pertinente da sua história. É a força motriz questionadora. É revelador sob um novo prisma. O significante quando aparece, suscita novas perguntas, permite que algo seja trazido à luz. A pergunta relevante: “Qual é, pois, essa combinação de significantes que, ultrapassando a minha vontade, organiza a repetição dos meus sintomas e garante que um deles nasça na hora exata, para que eu saiba que a minha infelicidade decorre exclusivamente do meu desejo?” Não é a pergunta do por que faço isso – pergunta do signo. É a pergunta do como faço isso, em que condições meu desejo se desnuda. Tomar o sofrimento pela causa é fazer dele um signo; tomar o sofrimento como algo surpreendente e inusitado é reconhece-lo como um significante.
Quem coloca esse significante como um saber, na hora exata, é o inconsciente. Um saber inconsciente emerge através do significante que se repete. “O inconsciente é o saber da repetição”. O inconsciente movimenta a roda dos significantes para que eles ocupem em algum momento o lugar do significante manifesto, do S1. Do Um. “O inconsciente assegura a renovação do lugar do Um.” É um processo constantemente ativo que não para de exteriorizar significantes.
Aqui, até onde eu compreendo, entra um ponto extremamente importante para Nasio. Para ele o inconsciente faz o significante circular, não somente dentro do psiquismo do analisando, ele pode aparecer em todos os sujeitos com quem o indivíduo tenha uma relação transferencial. Para Nasio a estrutura não pertence a ninguém, ela nem mesmo existe em si, como não há inconsciente em si. “A interpretação repete hoje, no dito do analista, um sintoma que se manifestou no dito do analisando” (…). Ou melhor ainda: “A interpretação atualiza o inconsciente da análise.”
O inconsciente como linguagem é uma trama de significantes constantemente atualizados, é uma cadeia virtual de dizeres (atos, acontecimentos) que sabe atualizar-se num dito oportuno. E se o inconsciente se atualiza em ditos, ele ata, liga, cria pontes entre seres. É linguagem. O inconsciente não é individual, nem coletivo. Ele se cria no entre-dois, como um entidade que atravessa os atores da análise.
O gozo.
O conceito fundamental sobre o gozo se enuncia a partir do axioma “Não existe relação sexual”. Para tanto, Nasio, retoma a linha de argumentação sobre o sintoma. Sintoma é um signo, uma interpretação do paciente que faz surgir uma imagem no analista; ele se transforma, no cursos de uma análise, em significante que surpreende e se impõe sem qualquer intencionalidade, mas o sintoma também é sentimento de dor, um sentimento penoso que é percebido pelo Eu. No entanto, para o inconsciente, o sintoma procura uma satisfação. A satisfação do desejo recalcado ou, pelo menos, o adiamento de um desprazer que fará com que esse sintoma se repita.
Então, o que é o gozo e quais suas diferente imagens? Em primeiro lugar, gozo não é prazer orgástico. O ser humano é perpassado por uma aspiração de uma realização absoluta do prazer, da felicidade, metaforizado por um prazer sexual absoluto proibido pelo incesto. Essa aspiração é o desejo (significante da falta). A realização do desejo é refreada pelo recalcamento, o que gera uma tensão no aparelho psíquico. O sintoma, o ato falho, as lembranças e sonhos procuram uma descarga parcial dessa energia, o resto permanece represado como excesso que superexcita as zonas as erógenas (eu diria o corpo, lembrando a importância da história libidinal do sujeito e a noção de fixação). Um terceiro destino para essas descargas, destino absolutamente hipotético e ideal, seria a de uma descarga total de energia (o que equivaleria a trazer os níveis de energia a zero – ou seja, ao estado inorgânico).
Pois bem, os três destinos, acima relatados, segundo Nasio, corresponderiam aos três tipos de gozo em Lacan. O gozo fálico (descarga parcial). Fálico pois o que impõe o limite ao gozar é a função falica, uma comporta que regula o que sai e o que fica em termos de energia psíquica. Essa função limita o acesso do gozo ao exterior, limita o acesso aos acontecimentos inesperados, às fantasias, às produções externas. Já a energia que permanece no sistema psíquico corresponde ao mais-gozar. O “mais” reflete o excedente de energia que aumenta a tensão psíquica. Cria, portanto, um estado permanente de erotogenia. Por fim, a terceira categoria seria a do gozo do Outro, estado ideal em que a tensão seria totalmente descarregada sem qualquer limite. É a descarga que o sujeito deseja e supõe no Outro, um ser ideal. Para um neurótico obsessivo, esse horizonte inalcançável é a morte, a catástrofe, a compulsão à repetição; para o histérico, é um oceano de loucura, de perda de controle.
Aqui Nasio retoma um pouco a questão edipiana, o que demanda alguns complementos. Para a criança, a mãe (ou o que representa a função materna) nos primeiros anos de vida, proporciona um sentimento de completude que é terminada, pelo colapso narcísico, pelo fim do estádio do espelho. Bem, o Edipo nada mais é do que uma idealização de um gozo pleno, através da figura mítica do incesto, em que a criança vislumbra um gozo absoluto. A maneira como as imagens idealizadas de gozo absoluto e como o indivíduo lida com as limitações que encontra em sua história libidinal é o que vai determinar os processos (ou as estruturas para um lacaniano) psíquicos e as formas de elaboração das frustrações.
Nesse sentido, a psicanálise retém a miragem fundamental do gozo absoluto numa relação incestuosa. Um gozo absoluto que não pode existir. É aqui onde começa e termina o saber psicanalítico. Pois o gozo absoluto é o real incognoscível. Trata-se de um gozo sexual, não no sentido de um gozo genital, mas um gozo perfeito experimentado pelo (através do) Outro, acompanhado de uma fantasia de completude e onipotência. O Outro pode ser qualquer personagem mítica, diga-se de passagem (não só a mãe). Dessa maneira, da mesma forma que a criança sonha com a relação sexual perfeita, a psicanálise reconhece que tal relação sexual não existe, pois esse Outro não existe. Esse lugar do incesto impossível é também o lugar do saber impossível, pois onde a criança supõe o mito do gozo do Outro, a psicanálise sabe a impossibilidade dessa realização, mas não pode formulá-la. Impossível escrevê-lo com letras, signos que digam qual seria a sua natureza. O gozo é o lugar em que não há significantes também. É nesse sentido que se deve entender “não existe relação sexual” – não existe relação simbólica entre um suposto significante de gozo masculino e feminino, imaginados como gozo absoluto. Não existe relação entre dois significantes ausentes. A rigor, segundo Nasio, não há que se falar também em significantes para o gozo relativo, pois o gozo não tem significante. Aqui eu me permito uma discordância, ainda que provisória e, talvez, prematura: se há limites, se há entrada num universo simbólico, então o gozo, se não tem um significante, produz um significante sobre o que ele é. Como se vê, isso nada tem a ver com o encontro erótico entre os órgãos sexuais de parceiros. Nesse sentido, Nasio admite que há significantes que possam circunscrever as zonas locais em que o corpo goza. A psicanálise reconhece apenas as fronteiras significantes que delimitam as regiões do corpo que são focos de gozo.
Nasio faz, então, uma digressão sobre o conceito de falo ou de função fálica. Função limitadora, ela baliza o gozo, o fluxo de energias orientado para um objetivo. O falo marca a origem do gozo, os obstáculos e suas exteriorizações (sintoma, fantasia, etc.). A função fálica, limitadora estabelece uma fronteira, além da qual está o mundo idealizado e mitificado do gozo absoluto. E por que essa função está marcada por um referente masculino? Por que a psicanálise partiu da idéia de castração para chegar a esse conceito (e por razões históricas e culturais à época em que a psicanálise se instituiu). No entanto, aqui o falo é uma metáfora. A psicanálise lacaniana se refere, por exemplo, à função paterna e materna e não à mãe e o pai na constituição do Édipo e nos mecanismos de castração. Da mesma forma, refere-se ao masculino e ao feminino por sua função simbólica.
Nasio, ao final dessa primeira lição faz uma retificação: Lacan não considerava o gozo como uma entidade energética. Lacan dizia que a energia não é uma substância, mas uma entidade numérica. É a cifra de uma constância. “Mas o gozo seria uma energia se, seguindo a metáfora freudiana, o considerássemos um impulso, nascido numa zona erógena do corpo, tendente a um objetivo, que esbarra em obstáculos, abre saídas e se acumula.”
Aqui eu me permito um questionamento: de fato, tudo o que Nasio nos disse acima está em desacordo com essa sua colocação. O gozo é a descarga ou a retenção ou a idealização da descarga dessa energia. Não é a energia em si. Enfim, ainda resta muito a refletir sobre o conceito de gozo, mas para “dessubstancializá-lo” melhor seria falar em um verbo – “gozar” – no lugar do substantivo “gozo”.
As relações entre inconsciente e gozo.
O elemento faltante na cadeia de singnificantes que compõem o inconsciente é o gozo. Não há representação do gozo, mas há um lugar, o do furo. O gozo limitado é aquele que tem bordas e nelas aparecem significantes. Se pensarmos no gozo ilimitado, não há borda, é difuso, sem vínculo com qualquer estrutura particular. É identificado pelo sujeito como uma miragem, como um fantasma. O sintoma e a fantasia são os dois recursos do neurótico para se opor ao gozo desmedido. O sintoma é o gozo fálico e a fantasia, o mais-gozar. No histérico, por exemplo, a fantasia faz com que o gozo escape a ele incessantemente. Aqui um ponto meu sobre a práxis analítica: não há que se esclarecer em análise a natureza e as consequências dessa fantasia. Ela sustenta uma posição. O importante é que a fantasia apareça como tal, como subterfúgio para impedir um gozo pleno, esse impossível, e que a energia psíquica possa circular a partir dessa fantasia e não ficar ali aprisionada. Nesse sentido podemos entender que o desejo é uma defesa contra o gozo.
“Assim, o gozo do Outro é um sonho paradisíaco que se oferece ao neurótico de maneiras diversificadas e contraditórias: primeiro, é um sonho que lhe é caro e ao qual ele aspira; depois é um sonho que ele sabe irrealizável, quimérico e fora de seu alcance; e, por fim, é acima de tudo um sonho que ele sabe que se, por azar ou por felicidade viesse um dia a se realizar, seu ser ficaria em perigo.”
“Onde fracassa a fala, aparece o gozo”
Somos seres falantes (grau empírico e comportamental, não-analítico), somos seres habitados pela fala (somos expostos à linguagem) e somos seres ultrapassados pela fala (quando um dito se diz fora de mim, à minha revelia). Nessa última instância, o corpo é afetado. O corpo como gozo, como instrumento de mediação de energias psíquicas, sendo que o corpo orgânico seria apenas uma caixa de ressonância. Sendo assim, nosso corpo está marcado pela linguagem. Quando o corpo é atingido por uma fala que nos ultrapassa, aparece o furo, ele é um corpo que goza. Parte da energia é descarregada, parte é armazenada e tensiona o aparelho psíquico (que é corpo).
A fala fracassa porque o desejo fracassa e esse insucesso tem direta relação com o fato de estarmos imersos no simbólico, nos mil e um sentidos. Até a satisfação plena se estende um campo com mil labirintos. O desejo falado esbarra numa multidão de equívocos e de polissemias. A análise é um caminho limitado, mas infinito, pois desdobramos esse desejo falado, descortinando-o e expandimos as fronteiras do possível. Uma vez dita a palavra, abre-se o caminho para a satisfação, até esbarrarmos naquele dito, ato, sonho que nos surpreende novamente e que faz circular o carrossel de significantes do inconsciente.
Nesse sentido, é preciso fazer uma distinção clara entre o gozo e o prazer. O prazer é descarga, no gozo, há sempre um aumento de tensão no aparelho psíquico, porque ele está ligado a um ato que involuntário que propõe uma descarga limitada de energia, mas que, ao mesmo, tempo deixa um resíduo que provocará a repetição. Por isso, e aqui faço um adendo, a noção de gozo está intimamente ligada à pulsão de morte, à repetição (ou compulsão à repetição). No gozo se vivencia uma tensão quase intolerável, que é misto de estranheza e embriaguez. O gozo é o estado máximo em que o corpo é posto à prova. O corpo é arrastado, levado. Experimenta-se o vago sentimento de uma força que nos arrasta para a atuação. Nos atos do gozo, o sujeito é apenas corpo. E é importante notar que o sujeito não goza, porque o gozo não tem significante (o sujeito sim), mas alguma coisa goza em nós, fora de nós. Portanto, o gozo é o motor da análise.
“Segundo Freud, as variações de tensão energética no âmago do isso são percebidas pelo próprio Isso. Em vez de dizer, como Freud, que o Isso, reservatório das pulsões, autopercebe suas próprias variações de energia, Lacan propõe: o inconsciente trabalha e, ao trabalhar, isto é, ao garantir a repetição, o inconsciente goza.” Repare que não é o sujeito quem goza, mas o inconsciente. O inconsciente como estrutura.
Frederico Celentano